segunda-feira, 8 de abril de 2013

A IGREJA PODERÁ USAR VINHO SEM ALCOOL EM MISSAS.


Caroline AleixoUberlândia, MG

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Bispo diocesano de Uberlândia, dom Paulo Francisco Machado (Foto: Caroline Aleixo/G1)Bispo de Uberlândia disse que vinho sem álcool é
inválido (Foto: Caroline Aleixo/G1)
Depois que a nova Lei Seca estabeleceu tolerância zero para qualquer motorista que for flagrado dirigindo com algum vestígio de álcool no organismo, a discussão se estendeu também à Igreja Católica. A questão de usar vinho comum durante a celebração da missa ou substituí-lo pela bebida sem álcool foi comentada pelos padres e, em algumas lojas de Uberlândia, houve aumento da procura pela bebida.
O bispo de Uberlândia dom Paulo Francisco Machado disse que o assunto vai ser discutido durante a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil deste ano, mas para ele o vinho sem álcool não condiz com a legislação católica, salvo em alguns casos especiais. 
Conforme previsto no Código de Direito Canônico, o sacramento da Eucaristia deve ser oferecido com pão e vinho. O vinho deve ser natural, do fruto da videira e não deteriorado. “O vinho canônico feito especialmente para ser usado nas missas é o mais puro, sem mistura de outras substâncias. Não se permite o uso de suco de uva, por exemplo, porque uma vez que Jesus Cristo fez uso do vinho, a Igreja não se sente no direito de mudar a matéria do sacramento”, disse dom Paulo.
O vinho canônico é o de maior teor alcoólico em relação aos tradicionais. Chega a ser graduado em quase 10% a mais de álcool justamente para garantir a conservação da bebida, que é consumida em pouca quantidade durante as celebrações católicas. 
De acordo com o bispo diocesano, não há nenhum pronunciamento da Santa Sé que autorize o vinho sem álcool. Mas pode ser usado o mosto, que é uma mistura do sumo de uvas antes do processo de fermentação. "Ou seja, não é o suco de uva e nem chega a ser vinho, já que não foi fermentado". Embora o mosto seja matéria válida para a celebração eucarística, só é permitido em casos de padres que sofram de alcoolismo ou por restrições de saúde mediante apresentação de atestado médico. A permissão pode ser concedida pelo bispo da diocese responsável.  
Acho que muito mais do que ficar estabelecendo uma legislação sobre quantitativos de álcool no organismo é preciso que se eduque as pessoas"
Dom Paulo Machado
No caso da regulamentação da Lei Seca, dom Paulo foi enfático em defender a doutrina católica e não tem conhecimento de padres que tenham feito uso de vinho sem álcool para estes fins. Os que consomem, segundo ele, são especialmente por questão de saúde ou por já terem tido problemas com alcoolismo.
Machado comentou ainda que se o padre for parado na blitz da Lei Seca, após celebrar uma ou mais missas, infelizmente são constrangimentos que correm o risco de acontecer em virtude do cumprimento da Lei.
“Ao consagrar a Eucaristia, consumimos uma mínima quantidade de vinho e ainda sim com água adicionada, que seria impossível de embriagar. Mas é como diz aquela frase famosa ‘Summa jus, summa injuria’, que quer dizer a justiça extrema é uma extrema injustiça. Não me cabe criticar, mas acho que muito mais do que ficar estabelecendo uma legislação sobre quantitativos de álcool no organismo é preciso que se eduque as pessoas. E educar não é só informar, é formar a pessoa no sentido dos valores. A pessoa com formações em valores terá os devidos critérios para dirigir e não dirigir”, opinou o religioso.
Padre defende tradição e diz que compreensão depende da fé
Padre Itamar da Paróquia São Judas Tadeu em Uberlândia, MG (Foto: Caroline Aleixo/G1)Padre ressaltou direito de pedido de contraprova na
blitz da Lei Seca (Foto: Caroline Aleixo/G1)
O padre Itamar de Almeida Machado, da Paróquia São Judas Tadeu, localizada no Bairro Presidente Roosevelt, celebra de quatro a cinco missas no domingo e sempre fez uso do vinho canônico alcoólico. Ele afirmou que leva pelo menos de 20 a 30 minutos antes de sair da igreja e dirigir. Além disso, ele salientou a possibilidade de pedir a contraprova do teste de bafômetro. “Eu acho que nesse caso, quando ingerimos uma mínima quantidade de álcool, nossa situação cabe à mesma do bombom de licor. Além dessa meia hora que eu espero, caso eu seja parado em uma blitz, eu tenho o direito de realizar o teste novamente em 15 minutos, tempo suficiente para que o corpo absorva o álcool dessas pequenas quantidades”, comentou.
Sobre a polêmica envolvendo a doutrina da Igreja e a Lei Seca, o pároco expressou a opinião justificando que a compreensão da sociedade depende dos dogmas de fé. “O que celebramos no sacrifício da missa é um sacramento e não um memorial e as pessoas deveriam entender isso. Quando eu celebro, não estou tomando vinho e sim ingerindo o corpo e o sangue de Cristo e isso é questão de fé. Não é um simbolismo, é algo real. Ou eu creio ou eu não creio”, defendeu Itamar.  
Vinho tradicional continua sendo o mais procurado
O G1 entrou contato com duas das principais lojas de artigos religiosos de Uberlândia e constatou que houve aumento na procura por vinhos canônicos sem álcool, mas que ela ainda é pequena em relação à bebida tradicional.
Os valores do vinho com álcool giram em torno de R$ 20 enquanto a versão não alcoólica custa de R$ 30 a R$ 40. Além de ser mais caro, a nova versão tem a desvantagem de ceder mais rápido, já que não possui álcool para mantê-la em conservação por mais tempo.
Vinho sem álcool Uberlândia (Foto: Caroline Aleixo/G1)Vinho canônico tradicional é mais barato e continua sendo o mais procurado em estabelecimentos especializados em artigos religiosos (Foto: Caroline Aleixo/G1)
Em um dos estabelecimentos localizado no Centro, o vinho sem álcool ainda não é vendido e o canônico tradicional continua sendo o mais procurado. Segundo informou a proprietária da loja, alguns clientes já procuraram pelo sem álcool e ela chegou a fazer pedido, no entanto, não trabalha com o produto em virtude da validade rápida e por ser ‘antilitúrgico’.
O proprietário de outro estabelecimento e também de uma distribuidora de artigos religiosos, Gabriel Guimarães Gomes, contou que trabalha com as duas versões. Contudo, a de teor alcoólico continua sendo a mais vendida. “A procura pelo sem álcool ainda é mínima, mas está acontecendo. O tradicional eu vendo de 90 a 100 garrafas ao mês enquanto o sem álcool sai de 20 a 30 garrafas ao máximo. Ou seja, quatro a cinco vezes mais”, comparou.

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