A produção de energia elétrica era monopólio estatal até bem pouco tempo no Brasil. As recentes mudanças institucionais introduzidas no setor elétrico, com a criação da ANEEL e a instituição do Mercado Atacadista de Energia (MAE) deram origem a um novo modelo.
Na esteira das alterações normativas, finalmente, a partir de julho de 2000, já é permitido a qualquer empresa produzir energia e vendê-la, sem nenhuma restrição, a qualquer consumidor.
O transporte da energia foi também alvo de nova regulação, não havendo mais obstáculos à sua contratação, a qual deve seguir uma tabela de preços já estabelecida.
Com esse novo modelo institucional do setor elétrico, tornou-se possível a produção de energia elétrica a partir do lixo com o envolvimento da iniciativa privada e passaram a ser viáveis parcerias entre empresas e prefeituras.
E é muito significativa a contribuição que essa nova forma de se gerar energia pode trazer.
De fato, cada 200 ton/dia da fração orgânica dos resíduos sólidos domiciliares permitem a implantação de uma Usina Termelétrica com a potência de 2 MW, capaz de atender uma população de 20 mil habitantes. Isso quer dizer que, se a fração orgânica (60%) de todo o lixo domiciliar brasileiro, que é da ordem de 120.000 ton/dia, fosse utilizada para produzir energia elétrica, poderíamos implantar Usinas Termelétricas com potência significativa, cujo valor seria apreciável.
Para as indústrias, haveria um tríplice ganho: poderiam contar com uma fonte adicional e permanente de suprimento de energia, tendo, potencialmente, uma alternativa adicional para a disposição dos resíduos não perigosos que geram, além dos ganhos econômicos decorrentes dessa nova forma de geração de energia e disposição de resíduos.
Para os municípios, a economia seria muito grande. Seus gastos com a implantação e a operação de aterros sanitários seriam quase inteiramente evitados. Além disso, seriam reduzidas as distâncias percorridas pelos caminhões de coleta, outra forma importante de se economizar e, ao mesmo tempo, melhorar o tráfego urbano. E tudo isso, sem a necessidade de investimentos por parte das Prefeituras, uma vez que tudo poderia ser feito através de terceirização, pela concessão dos serviços a empresas.
Os investimentos ficariam a cargo dos empresários, os quais poderiam se beneficiar da possibilidade de vender a energia elétrica gerada, além de poderem cobrar uma taxa pela recepção do lixo – desde que em montante inferior à economia que estivessem proporcionando às finanças municipais.
Ademais, as vantagens sociais são inequívocas. Além da geração de empregos, crianças e adultos que buscam retirar dos lixões meios para subsistir, trabalhando em condições subumanas, poderão passar a integrar cooperativas voltadas para uma atuação organizada e regular em Centrais de Reciclagem Integral de Resíduos.
Tecnologias: Incineração vs. Processos Biológicos
As tecnologias disponíveis não são tão recentes assim mas só agora vão poder ser adotadas no Brasil. Nos Estados Unidos, na Europa e no Japão já foram implantadas Usinas Termelétricas alimentadas por resíduos, notadamente a partir dos anos 80. Essas tecnologias, embora já se mostrem economicamente viáveis, em muitos casos apresentaram problemas ambientais.
A incineração e o processamento biológico são, essencialmente, as duas formas adotadas para se produzir energia elétrica com a quase total eliminação da necessidade de aterros sanitários.
A incineração é um modo ambientalmente mais arriscado de resolver o problema. Isso porque resulta na emissão de dioxinas e furanos, gases potencialmente perigosos para a saúde humana, e que, suspeita-se, poderiam induzir até o câncer.
É bem verdade que foram desenvolvidos nos últimos anos sistemas de filtros capazes de reduzir substancialmente esse risco. A tal ponto que até a Alemanha, país tido como talvez o mais rigoroso em matéria de controle ambiental, chegou a conceder licença para o funcionamento de número significativo de incineradores. Mesmo assim, em vários países como Suécia, Canadá, Bélgica e Holanda foram fechados alguns deles em função dos riscos que apresentam.
Além disso, há também o problema de que acarretam uma perda de matéria orgânica, algo sempre contra-indicado como prática ambientalmente sustentável.
Não se pode esquecer, por fim, de que os incineradores tendem a agravar o efeito estufa, perigo ao qual o mundo está cada vez mais atento.
De um modo geral, os processos biológicos são mais viáveis economicamente e não agridem a natureza. Esta tecnologia faz com que os resíduos orgânicos, através da compostagem, se transformem em adubo orgânico, o qual, se adequadamente processado, pode ter alta qualidade. Ao mesmo tempo é produzido metano suficiente para gerar energia elétrica em quantidade apreciável, com produtividade similar à dos incineradores, e ainda com grandes vantagens ambientais.
Tais vantagens decorrem do aproveitamento integral da matéria orgânica sem a emissão de dioxinas e furanos, os gases perigosos para a saúde do homem. Além disso, os processos biológicos contribuem para evitar o agravamento do efeito estufa.
Outro ganho energético interessante reside na possibilidade de armazenamento do metano para geração de energia elétrica preferencialmente nos horários de pico, o que aumenta ainda mais os ganhos econômicos.
Os processos biológicos permitem, assim, a venda de energia e adubo sem que a natureza perca matéria orgânica e tornam possível às Prefeituras a quase eliminação da necessidade de aterros sanitários.
Além do mais, uma pré-seleção do lixo urbano poderia permitir a retirada de latas de alumínio e aço, papel, papelão, vidro e plástico, os quais também tem um valor econômico. Outro ganho importante seria a geração de empregos na triagem desses materiais, com o uso de equipamentos de baixo custo, como esteiras e prensas.
Em conclusão, os processo biológicos são via de regra preferíveis, devendo os incineradores ser adotados apenas em casos muito extremos, sob rígido controle e quando as situações locais o exigirem, em função, por exemplo, de uma grande dificuldades de aproveitamento do adubo orgânico gerado.
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